quinta-feira, 5 de março de 2009

A redacção de Tommy

 
 
Em breve, os pais de Tommy, que se tinham separado, iam chegar para uma reunião sobre o seu fracasso escolar e comportamento perturbador.
Nenhum dos pais sabia que eu convocara o outro.
Tommy, filho único, fora sempre uma criança alegre, cooperante, e um excelente aluno. Como iria convencer o pai e a mãe dele que as más notas eram a reacção de uma criança desgostosa à separação e ao divórcio próximo dos pais que adorava?
A mãe de Tommy entrou e sentou-se numa das cadeiras que eu colocara perto da minha secretária. Depois, chegou o pai. Ignoraram-se acintosamente.
Enquanto eu fazia um relatório pormenorizado do comportamento e do aproveitamento de Tommy, rezava para que fosse capaz de encontrar as palavras certas para unir aqueles dois e ajudá-los ver o que estavam a fazer ao filho.
Mas as palavras pareciam não surgir. Talvez se eles vissem um dos testes dele, desmazelado e cheio de borrões.
Descobri uma folha amarrotada e manchada de lágrimas na sua secretária. Estava escrita dos dois lados, e continha uma só frase, garatujada repetidamente.
Em silêncio, alisei o papel e estendi-o à mãe de Tommy. Ela leu-o e, sem uma palavra, estendeu-o ao marido. Ele franziu a testa. Depois, o seu rosto suavizou-se. Analisou as palavras garatujadas, durante um momento que pareceu uma eternidade.
Por fim, dobrou cuidadosamente o papel e estendeu a mão para a mão estendida da mulher. Ela limpou as lágrimas e sorriu para ele. Os meus olhos também estavam marejados, mas eles não pareceram notar.
À sua maneira, Deus dera-me as palavras para reunir aquela família. Ele guiara-me até à folha de papel de cópia amarela, coberta com o desabafo do coração perturbado de um jovem.
“Querida Mãe... Querido Pai... amo-vos... amo-vos... amo-vos.”
 
Jane Lindstrom
 
 
Canja de galinha para a alma
Mem Martins, Lyon Edições, 2002

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